BioBrasil: entrevista a Roberto Denser

Nesta emissão de BMQS, entrevistamos o escritor Roberto Denser, que nos fala sobre seu mais recente sucesso, o romance pós-apocalíptico "Colapso".

Neste podcast de BMQS, mergulhamos no universo de um autor que, com seu romance mais recente, conseguiu captar a atenção tanto da crítica quanto dos leitores. Seu nome é Roberto Denser, e sua obra Colapso (2023), publicada pela DarkSide Books, é um retrato inquietante da condição humana, de nossas contradições e zonas obscuras.

Ao longo desta entrevista, conheceremos mais sobre as origens de Roberto, seu processo criativo, as ideias que deram forma a Colapso e também o lugar de sua obra no panorama literário brasileiro contemporâneo.

Chapter I: Todos os começos são obscuros

Foto: DarkSide Books

Roberto Denser nasceu em Bayeux, em 1985, mas cresceu no bairro operário de Tibiri, na cidade de Santa Rita, localizada no estado da Paraíba, no Nordeste do Brasil. Trata-se de uma área de urbanização recente, cercada por fábricas e conjuntos habitacionais populares, habitados por pessoas humildes como seu pai, que trabalhava como açougueiro no mercado público da cidade.

Sua paixão por histórias começou muito cedo: não importava se era um filme ou uma fofoca doméstica. Assim que captava os primeiros acordes de uma boa narrativa, aguçava os ouvidos e deixava a imaginação voar. Mais tarde, descobriu que também podia encontrar histórias fantásticas nos quadrinhos e nos livros, tornando-se um leitor compulsivo, devorando tudo o que lhe caía nas mãos. O próprio Denser conta:

Na minha adolescência, a prefeitura inaugurou uma pequena biblioteca pública no meu bairro e comecei a passar ali todas as minhas horas livres. Foi mais ou menos nessa época que comecei a escrever meus primeiros contos e a sonhar em me tornar escritor.

Ao concluir o ensino médio, Roberto Denser iniciou o curso de Letras, acreditando que isso lhe serviria como um atalho para desenvolver sua carreira literária. No entanto, as coisas não foram tão simples. E é que, como diz a Imperatriz Infantil em A História Sem Fim, todos os começos são obscuros.

Antes de iniciar o segundo ano, abandonou os estudos e mudou-se para outro estado, onde passou a trabalhar em uma empresa de transportes. Quando ficou desempregado, voltou para casa e ingressou no curso de Direito, que concluiu sem entusiasmo, “quase no modo piloto automático”, como ele próprio confessa.

Logo começou a publicar seus primeiros contos e a participar do núcleo literário Caixa Baixa, um coletivo fundado pelos escritores Roberto Menezes, Caio Cesar e Bruno Galdencio, que dinamizou os círculos literários paraibanos. Dessa época é seu primeiro livro, A orquestra dos corações solitários, publicado de forma independente, com relatos sobre a solidão inspirados em canções dos The Beatles. Ao concluir o curso, decidiu não exercer a advocacia. Mudou-se para o Rio de Janeiro e passou a trabalhar como livreiro.

Ali, influenciado pelo poeta chileno Roberto Bolaño, um de seus escritores favoritos, publicou Para Elisa, um romance policial com múltiplos narradores e estruturado em forma de documentário, que narra o pacto suicida entre uma poetisa famosa e um artista plástico medíocre e desconhecido.

Anos depois, já pai de dois filhos e novamente desempregado, fez uma promessa a si mesmo: só voltaria a pisar em uma livraria quando se tornasse escritor… e assim foi! Colapso, uma distopia pós-apocalíptica autopublicada na Amazon, teve sucesso imediato e chamou a atenção de várias editoras, entre elas a DarkSide Books, que em 2023 lançou o livro em uma belíssima edição que não parou de colher êxitos. De fato, a obra  foi semifinalista do Prêmio Jabuti em 2024.

Chapter II: A casa que Jack construiu

Todo escritor guarda pequenos rituais, manias ou superstições ao enfrentar a página em branco. Roberto Denser não é exceção. Na segunda parte da entrevista, ele revela como encontra inspiração e qual método o acompanha no processo de escrita.

Conta que, no início, costumava escrever em uma antiga máquina Olympia alemã, comprada em uma loja de antiguidades, mas aos poucos acabou se rendendo ao século XXI e hoje utiliza um computador convencional, equipado com um software específico para edição de textos. Sobre seu método de trabalho, Roberto explica:

Procuro trabalhar pela manhã, com pequenas metas diárias e um prazo para concluir o primeiro rascunho. Só depois desse primeiro rascunho começo a revisar e reescrever o texto.

E a inspiração? Vem de outras formas de arte: sobretudo da música, mas também do cinema, das artes plásticas… e, por incrível que pareça, de lavar louça. “Já tive excelentes ideias enquanto lavava uma montanha de pratos sujos”, afirma. Além disso, como a maioria dos escritores, bebe muito café, fala sozinho e só escreve usando seu chapéu de vaqueiro… Mas essa é outra história, que contaremos em outra ocasião.

Chapter III: Se você encarar um abismo...

Entramos no coração da entrevista com Colapso, o romance que fez brilhar a estrela de Roberto Denser. A história mergulha nas zonas cinzentas da moral, onde os personagens transitam entre a culpa, o desejo e a fragilidade do humano. Se quiserem saber mais, recomendamos ouvir o podcast do programa  que dedicamos à obra, que inclui uma versão dramatizada de um conto inspirado no universo de Colapso.

Roberto explica que queria escrever uma história pós-apocalíptica em que a moral humana se ajustasse à forma como ele a compreende — uma ideia moldada por suas experiências de vida, que ele resume de maneira magistral:

Cresci em um bairro violento, e grande parte dessa violência era praticada por pessoas que, muitas vezes, até então, eram verdadeiros exemplos de cidadania. Compreendi que as pessoas não são 100% boas nem 100% más, que não podemos dividir o bem e o mal (…) que tudo está misturado, inseparável, em porções variáveis e fluidas (…) Um mesmo homem pode ser cruel com seu inimigo e gentil com seu amigo.

Seus personagens — complexos, ambíguos, inquietos — exploram essa ampla paleta moral de acordo com diferentes circunstâncias e condicionantes. Assim, no livro, os protagonistas mais velhos conservam uma moral semelhante à nossa, com a qual podemos nos identificar, enquanto os mais jovens possuem uma visão mais individualista do mundo, ligada às suas vivências nesse contexto brutal, que é o único que conhecem. Para concluir, ele afirma que o que distingue Colapso de outros livros do gênero é

sua brutalidade crua, a transparência com que expus a violência e uma perspectiva mais realista da natureza humana, que, enquanto viver, jamais deixará de alimentar seus instintos mais primitivos.

Epilogue: o conhecimento não ocupa espaço

É sempre inspirador ouvir um autor falar do futuro, dos caminhos que ainda não percorreu. Roberto revela, ao final da entrevista, que está dando os últimos retoques em Escisión, a continuação de Colapso, e finalizando um thriller policial, ao mesmo tempo em que escreve alguns roteiros para novelas gráficas. Denser transmite uma sensação de continuidade, de busca constante, como se cada obra fosse apenas uma estação de passagem em uma viagem mais ampla pela condição humana.

Você pode acompanhar Roberto Denser no Instagram ou visitar sua  página oficial.

BioBrasil é uma coluna do programa Brasil es mucho más que samba dedicada a divulgar a biografia de expertos, profissionais e personagens (históricos e atuais) da vida cultural, política e social brasileira. Brasil es mucho más que samba se emite todas às terças-feiras, às 17h30, em Rádio USAL. Para sugerir uma pauta ou contatar com a equipe do programa, escreva ao masquesamba@usal.es

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